Capoeira é história

Capoeira é história
capoeira é história de libertação

sexta-feira, 30 de novembro de 2018

Criaturas Certas e cheias de razão

Existi sim em outro lugar distante, criaturas sem empatia , sem gosto de ser solidárias e de aceitar que a existência não gira em torno unicamente da sua. Distante daqui existem seres emplumados com caldas imensas que para não arrastarem no chão suas belezas delegam as outras criaturas menos afortunadas à labuta de carregarem invariavelmente na posição curvada durante toda suas vidas, nesta realidade longínqua é um extremo privilegio, a maior premiação para essas dedicadas criaturas conhecidas como pequenos servos é a deformação que se cria em seu lombo depois de anos de dedicação. As criaturas Certas , sempre certas , absolutamente certas estão eternamente dispostas a justificar e manter tal status, elas se alimentam de outras criaturas , criaturas de sua mesma linhagem de evolução, mas segundo elas, essas criaturas, sub-raça, não fizeram por merecer e tomaram caminhos semotos, sem glamour e status, então hoje servem como refeição , caso contrário, caso tomassem os caminhos certos, dos Certos, seria canibalismo, selvageria, brutalidade devorá-las. Os Pequenos Servos não são devorados, recebem as vezes um olhar certo de aprovação dos Certos quase , bem perto mesmo , de agradecimento. Aliás os certos controlam a sua ração, é balanceada para suprir estritamente a finalidade de carregar a calda, nem mais , as vezes menos, assim eles não crescem também . Embora para os Certos um pequeno servo, esguio , quase raquítico e bem curvado é ótimo para ostentar. Os Certos, abastados e lindos, nesta existência remota, mantém a disposição das coisas inquestionavelmente imexíveis e defendem isso com enorme ferocidade. Tão certos e cheios de si , os Certos são intransigentes e dogmáticos. Se pudéssemos comparar no âmbito do direito internacional, ou melhor intergaláctico, ou até sócio político e histórico , falta o artigo 5° da constituição brasileira de 1988 para essas criaturas, entre outros artigos nesta distante existência, afinal por aqui aprendemos com as guerras interimperialistas, as duas grandes guerras mundiais , com os estados totalitários nazistas, fascistas , stalinistas , enfim acredito que diferente deles , dos Certos, aqui compreendemos que qualquer guerra fratricida não tem sentido.

quarta-feira, 14 de novembro de 2018

O novo

Uma civilização avançada, em outro sistema solar, enviou seu melhor cosmonauta para desvendar os segredos do universo e principalmente encontrar outras formas de vida. Como essa civilização tinha outra perspectiva de tempo e espaço, além de sua espécie ser contemplada pela maestria biológica da evolução natural aperfeiçoada pela expertise de sua tecnologia conseguindo obter um longevidade que beirava a eternidade. Eras depois o nobre cruzado, o cosmonauta volta de sua busca para prestar ao seu soberano relatórios parciais, ele é recebido como herói, banquetes e cortejos lhe são oferecidos, logo uma audiência é marcada para encontrar com o "Representante", era assim que chamavam o líder máximo do planeta, era uma única nação. O cosmonauta depois de festas e bebedeiras , encontra-se com o Representante, para sua surpresa já era outro representante, o novo, com roupas de rei e chifres enormes, chifres que ganhavam a atenção pelo tamanho e brilho, brotavam da testa do neo- representante. Ele saudou o cosmonauta e não deu muita importância para ouvir o relatório do cosmonauta, preocupou-se em falar da importância da figura do cosmonauta para o mundo e que algumas coisas haviam mudado, algumas simbólicas como agora todo soberano quando no poder deveria transplantar os maiores chifres em sua cabeça, quanto mais chifrudo mais soberano. O Novo não queria ser chamado mais de representante , modestamente , demonstrando sua simplicidade e humildade pediu ao aventureiro do espaço que o chamasse de Vossa Excelência Soberano o Novo. Tratamentos pessoais acertados, o Novo ignorou relatórios e protocolos e foi narrando dissertativamente as novas mudanças e conquistas da nação, não era mais um governo do povo, ele explicou pacientemente que o povo não sabia o que queria e a governabilidade exigia práxis, e neste sentido aboliu a diversidade pois lidar com várias línguas e costumes dava uma trabalheira danada, e a nova política era padronizar, de agora em diante , todos deveriam pensar igual, era o novíssimo ordenamento jurídico do mundo civilizado. E ele, o Novo, foi descrevendo empolgado sua convicção , e o melhor, o povo deveria pensar como o seu soberano porque assim pouparia o Novo de consultar as bases, muito pratico , eficiente e justo. O novo disse em tom de ironia que somente o chifre era exclusividade do soberano, portanto somente ele poderia adornar sua importante testa com aqueles chifres majestosos, seus assessores mais próximos utilizam a maior honraria que eram as desejadas coleiras douradas . O novo, explicou que o melhor para o mundo não era ter um representante, mas sim um dono, assim recairia para o dedicado soberano o fardo de gerir o planeta e seus habitantes seguiriam suas vidas sem pertubação. O Cosmonauta ouviu tudo atentamente e fez uma única pergunta ao Novo: "-Vossa Excelência Soberano o Novo, todos aceitaram a nova política?", a resposta foi a seguinte:"- uma classe subversiva , conhecida como os Famintos, reagiu, fizeram protestos , escreveram manifestos , somente não fizeram greve de fome. Então, para pacificar , demos comida e coleiras douradas para algumas lideranças e pedimos que eles reunissem as lideranças mais intransigentes ao dialogo para chegarmos a um acordo, a grande reunião foi marcada para o mais importante símbolo da nossa nação, o famoso Galpão dos Ancestrais, chegando lá , todas as lideranças com coleiras e sem coleira já estavam aptas ao debate, então mandei bombardear e explodir tudo , pronto a vontade da civilização venceu os interesses corporativistas, desde então sou o soberano, o Novo, o incontestável. E de você Cosmonauta só quero que volte para sua missão no espaço, você lá no infinito é um símbolo, aqui não é nada." O Cosmonauta voltou ao espaço, talvez procurando um verdadeiro novo...

domingo, 11 de novembro de 2018

um outro mundo

Existia um mundo , um mundo distante do nosso, com costumes e línguas diferentes . Um mundo desigual socialmente, aliás com brutais diferenças sociais, um mundo futurístico, com invenções maravilhosas , rumo à conquista do universo. Porém , em sua profunda desigualdade não havia inventado uma máquina para repartir o pão, pois sim já tinha alimentos suficientes para todos, matematicamente viável à décadas. Contudo precisavam de uma máquina que sensibilizasse corações e mentes para solidariedade, era algo a ser construído. Enquanto um brilhante cientista não inventava tal máquina, essa pobre civilização que não sabia repartir o pão e por conta disso tinha milhões de famintos, adotava em sua política um presidencialismo à parmegiana, presidencialismo de coalizão, sendo que emblematicamente adotava também o bipartidarismo e de um lado eram os Comportados da Pátria do outro os travessos transnacionais . Eram dois partidos distintos tendo como intersecção o discurso de defesa daquele planeta e de seu povo. Os Comportados da Pátria tinham um discurso feroz de purismo da espécie e não aceitavam a visita de alienígenas, todos adotavam longas cabeleiras e os machos da espécie bigodes grandes e trançados. Os travessos usavam grandes e coloridos cabelos moicanos , além de raspar as sobrancelhas e defendiam o casamento poliândrico. Estes partidos tinham muitas , muitas divergências , mas convergiam na necessidade de acabar com a fome, todavia a muito essa convergência havia sido empurrada para escanteio. Houve um tempo que uma liderança da base dos comportados que se destacava e tinha o nome de Mediação , acreditava numa cultura de paz e numa comunicação positiva, entre os travessos também forjara nos debates internos das tendências o líder Persuasão , um jovem, filho do dono do partido, franzino , de boa fala e pouca estatura. Eram da mesma geração, gostavam de conversar, logo no primeiro encontro se atraíram , se enroscaram e se amaram despudoradamente, juntos, unidos , numa maior práxis de união de tendências , de quebra de correntes jamais vista, o brilhante cientista deveria analisar esse caso , um relacionamento entre lideranças da base de partidos divergentes. Como assim? Dizem, os linguarudos que na prática as bases partidárias de ambos os partidos cometiam atrocidades em nome do estatuto partidário, mas os cientistas políticos deste planeta diverso do nosso, afirmavam que lá , lá no congresso de lá, os lideres dos dois partidos, os graúdos, se amavam e se amavam em nome da maior convergência entre eles , o poder. Mas ali na base o amor entre seres de partidos diferentes era determinantemente proibido, era condenado a morte quem ousasse transgredir essa regra. Na realidade , outra convergência era essa entre ambos os partidos, nada de amor interpartidário, todos os seres do planeta tinham obrigação de denunciar tal aberração. Se eventualmente tal ação fosse tomada entre os grandes donos do partido era um estratégia aceita pela importante governabilidade, porém alguém da base jamais, nunca, nunquinha poderiam se amar, estava no estatuto bem explicado que somente odiar era permitido entre seres de partidos diferentes. Porém o amor visceral e indecente de Mediação e Persuasão era indestrutível, eles se amaram , inicialmente na clandestinidade, a despeito dos estatutos, dos partidos, dos seres do planeta, eles fizeram isso, se encontram e se entregaram ao suor e beijos molhados do amor de tal maneira que extrapolaram o segredo, o mundo , aquele mundo viu um amor jamais narrado e concebido, era uma subversão. Os donos dos dois partidos souberam dessa ato de amor nada natural conforme previstos nos estatutos dos partidos, o amor entre os dois eram tão grande que centenas de delatores fizeram denúncias nos partidos. A ordem do dia era exterminar esses terroristas, o dono dos travessos mesmo sendo o seu filho um dos acusados, não hesitou e acordou com a pena capital. Então , num dia, eles receberam mensagens em seus comunicadores, mensagens marcando um encontro entre os dois, eles foram, eles de fato não haviam enviados aquelas mensagens, mas viviam aquela saudade dos apaixonados e portanto não perdiam oportunidade de se encontrarem, foi então que em quarto se encontram e se entregaram a mais fugaz paixão. Agentes dos travessos e comportados trabalharam juntos nesta emboscada, verdadeira sinergia, colocaram bombas no quarto, as bombas foram efetivamente deflagradas e os amantes tiveram seus corpos partidos por seus partidos.Foi um estrondo louco, um cheiro de poeira tomou conta do ar, junto com uma leve fragrância de um perfume desconhecido. Os meios de comunicação ilegais tomaram conhecimento do fato, narraram a história, desnudou a política parmegiana , começaram , conflitos, convulsões sociais, os velhos políticos fugiram do planeta, era uma revolução, o pobre e brilhante cientista não conseguirá fazer à máquina de repartir o pão, então ela fez-se sozinha. Aquele perfume espalhou-se pelo planeta e a fome acabou-se.

sábado, 3 de novembro de 2018

Numa noite qualquer, numa praça

É assim que começa essa história, nada especial, acredito que ele queria passar despercebido na vida, até a natureza lhe ajudou nisso, não era grande, aliás era pequeno para média brasileira, embora tivesse uma estrutura óssea robusta, sim lembro-me bem, para quem olhava e reparava parecia um homem que iria crescer com seus ombros largos e rosto redondo, mas foi interrompido , não cresceu, devia ser o menor da turma , da rua , talvez da família. Parecia não se importar com política ou com polêmicas, vivia sua vida, as vezes ali sentado num banco de uma praça com mato ao seu lado. Não se importava em fazer amizades, mas tinha companheiros que também não se importavam em fazer amizades e isso os uniam, eram parecidos, a praça um ponto de encontro. Alguns diziam que ali aquela praça era maldita e aprisionava a vontade dos homens , se um desavisado começasse a utilizar , principalmente nas noites sua alma estava condenada e proibida de viver o mundo. O cotidiano da praça era uma verdadeira rede social primitiva restrita a oralidade, ali passavam homens e mulheres perdidos neste mundo, ela tinha sua contradição , era um ambiente familiar diuturnamente , geralmente, mas ao anoitecer se acendia fogueiras como se invocassem os perdidos da noite, passavam fantasmas, foragidos, buscavam-se drogas e também as consumiam. A praça era um ponto de encontro, era um ponto de encontro de consumidores de drogas, de banidos , de sem dinheiro e foragidos, então o encontro improvável dos diferentes, sem ideologias , sem militâncias , já distantes da escola e da família, era assim uma mesa improvisada de madeira apoiada nos joelhos dos jogadores com bancos precários serviam para jogar dama e falar da façanha dos outros, sim nas praças tem os seus mitos, seus transgressores, os ditos ou malditos valentões que na moda do cangaço desafiavam as autoridades de baixa patente da atalaia ostensiva, na maioria das noites era tapa na moleira que sofriam após respostas provocadoras , tais circunstâncias serviam de história na hora do jogo de dama. Muitos dos seus companheiros ele nunca soube os nomes verdadeiros, eram conhecidos por apelidos inusitados e em grande parte nada elegantes, eram ofensivos mesmo. Mas ali , neste universo paralelo e marginal, ele aprendeu a se defender das violências que tinham nas noites longas, aprendeu a se drogar e a brigar, lutava entorpecido e nem sempre para se defender agora era por diversão. Encontrou romances, não prosperavam, ao longo dos anos a indiferença era maior do que a dor, a ausência de perspectivas não era problema enquanto pudesse consumir tudo que o retirasse da sobriedade. Em alguns momentos a praça parecia um lugar divertido, com alegria , até um futebol na madrugada acontecia, com o tempo a violência se tornou mais presente e fratricida , bastava um olhar para o outro , era a paranóia da nóia, da merla, do crack. Uns dos seus companheiros sobreviveram, romperam a maldição e hoje não lembram ou não querem lembrar de histórias dignas de comparação à parte do Inferno na obra Divina Comédia de Dante Alighieri, outros tantos são pessoas em situação de rua , outros presos e outros mortos, quase todos antes dos 30 anos. Enquanto ao protagonista desta crônica, não sei bem ao certo, fala-se demais nas ruas, nesta oralidade das praças, que ele continua na praça , somente a noite , todas as noites, mesmos nas mais sombrias e chuvosas,se você quiser pode encontrá-lo , talvez até conversar com ele , contudo por sua própria conta e risco.